A Caravana de Bye Bye Brasil

Hoje vamos falar de um dos filmes mais aclamados do cinema brasileiro, considerado por muitos como uma das mais importantes produções da década de 70 e que entrou em novembro de 2015 na lista feita pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) como um dos 100 melhores filmes brasileiros de todos os tempos. 

Betty Faria com a Caravana Rolidei. Foto: Reprodução Google Imagens.

Comédia dirigida por Cacá Diegues, cineasta alagoano, Bye Bye Brasil é um filme de 1979 que conta a história de três artistas mambembes (Salomé, Lorde Cigano e Andorinha) que cruzam o país com a Caravana Rolidei, fazendo espetáculos para o setor mais humilde da população brasileira e que ainda não tem acesso à televisão. A eles se juntam o acordeonista Ciço e sua esposa Dasdô, com os quais a Caravana cruza a Amazônia pela rodovia Transamazônica até chegar a Altamira. No elenco estão nomes de peso como: José Wilker, Betty Faria, Fábio Jr e Marieta Severo. Na história, o personagem Lord Cigano, interpretado por José Wilker, vê as antenas de TV (as “espinhas de peixe”) como rivais das atrações circenses de sua Caravana. À época, a TV ainda era novidade nas regiões mais pobres e afastadas do país e sua introdução foi trazendo mudanças culturais, ganhando os telhados das casas e mudando a paisagem urbana das comunidades isoladas.

José Wilker com a Caravana Rolidei. Foto: Reprodução Google Imagens.
José Wilker. Foto: Reprodução Google Imagens.
Postar do filme. Foto: Reprodução Google Imagens.
Betty Faria. Foto: Reprodução Google Imagens.
Betty Faria. Foto: Reprodução Google Imagens.

O filme Bye Bye Brasil é super interessante pois mostra justamente essas transformações ocorridas no Brasil durante a década de 70 até o início dos anos 80, colocando em evidência as consequências econômicas, sociais e culturais do processo de modernização e industrialização do país, principalmente no interior e nas regiões mais afastadas do país. Entre estas está Alagoas, que é apresentada em parte do filme com cenários da cidade de Piranhas, povoado de Entremontes, Murici, Maceió e União dos Palmares, além de várias tomadas do Rio São Francisco. O filme ainda contou com cenários pela rodovia transamazônica, Belém, Manaus e Brasília.  

É incrível o poder e impacto que o cinema e entretenimento podem ter num local. Antes das filmagens do filme a cidade de Piranhas não possuía energia elétrica, esta foi levada pela produção do filme que além do fato alterou a rotina dos moradores nos 15 dias que estes ficaram por lá, deixando saudade para aquelas que participaram da figuração ou apenas acompanharam as filmagens. O filme deu visibilidade a desconhecida cidade de Piranhas e mostrou os primeiros indícios de que o isolamento cultural da região estava com os dias contados. 

Os locais que serviram de locação ainda permanecem intactos (pelo fato de Piranhas ser tombada como patrimônio histórico pelo IPHAN), já que boa parte foi filmada no centro histórico, com suas casas coloridas e praças, onde foram rodadas as cenas da feira, da chegada da Caravana Rolidei e do cantor Fábio Jr. tocando sanfona e embarcando na trupe. 

Filme: Praça da Igreja e Caravana passando. Foto: Reprodução Google Imagens.
Atual: Praça da Igreja. Foto: Reprodução Google Imagens.

Filme: Caravana no centro histórico. Foto: Reprodução Google Imagens.
Atual: Centro histórico. Foto: Reprodução Google Imagens.
Filme: Casas do centro histórico. Foto: Reprodução Google Imagens.
Atual: Casas do centro histórico. Foto: Reprodução Google Imagens.
Filme: Ponte. Foto: Reprodução Google Imagens.
Atual: Ponte. Foto: Reprodução Google Imagens.

Serviu também de cenário as edificações coloridas da praça principal, as ruas estreitas e a calmaria do povoado de Entremontes. Que também pouco mudou após o filme e onde foram filmadas as cenas da procissão da Divina Pastora, essa que nunca mais aconteceu após o registro feito pelas câmeras de Cacá Diegues. É nessa passagem pelo sertão nordestino a Caravana sente na pele o subdesenvolvimento econômico, a pobreza extrema e a religiosidade exacerbada – símbolo da esperança do povo brasileiro. 

Casa em que foram gravadas cenas dos personagens de José Wilker e de Jofre Soares, que interpretou um exibidor de filmes mambembe. Foto: Reprodução Google Imagens.
Procissão da Divina Pastora. Foto: Reprodução Google Imagens.

De Piranhas a trupe passa brevemente por Murici, na praça da Igreja Santuário de Santa Tereza, onde fazem um show vazio e se deparam com a nova realidade: os moradores preferem ver a novela Dancin Days à noite, na TV, a prestigiar o circo. Saídos de Murici a próxima locação alagoana é a churrascaria Laginha em União dos Palmares. Uma curiosidade bacana é que ambas foram sugeridas pelo fotógrafo alagoano, Celso Brandao, que foi diretor-assistente do filme! 

Filme: Santuário Santa Tereza em Murici. Foto: Reprodução Google Imagens.
Atual: Santuário Santa Tereza em Murici. Foto: Reprodução Google Imagens.
Churrascaria Laginha em União. Foto: Reprodução Google Imagens.

Após a passagem pelo sertão, a Caravana segue para Maceió, com cenas na praia da Avenida que mostram o Porto e a Braskem e ruas lotadas no centro. Retratando assim, as paisagens das cidades urbanas do Nordeste, cercadas de belas praias, e com as primeiras consequências do crescimento populacional: trânsito pesado, poluição e queda da qualidade de vida. É o processo de ocupação do espaço urbano, junto com a especulação imobiliária, o consumismo acelerado e a degradação ambiental.

Produção grandiosa até para os dias de hoje, Bye Bye Brasil cruzou o sertão nordestino e atravessou a Floresta Amazônica numa época que o acesso era ainda muito mais complicado a essas regiões. Um filme que vale a pena ser visto e com lugares que valem a pena serem visitados por sua beleza e história, ainda mais por seu cenário se manter igual, fazendo-nos sentir dentro do filme mesmo após quase 40 anos!

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